‘NOVEMBRO ROXO’ – Audiência pública sobre prematuridade aponta os desafios da rede pública de saúde

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A Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) promoveu, nesta quinta-feira (16), uma audiência pública para discutir a prematuridade e a importância do pré-natal. O evento, que faz parte da campanha ‘Novembro Roxo’, reuniu profissionais da saúde, representantes de órgãos públicos, da sociedade civil e demais interessados no assunto.

Segundo dados da Sesau (Secretaria de Saúde), em 2023, 397 bebês prematuros foram internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth. O número equivale a 45% das internações na UTIN. A prematuridade é o nascimento de um bebê antes da 37ª semana de gestação.

A deputada Angela Águida Portella (PP), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Família, da Mulher, da Criança, do Adolescente e Ação Social, autora do requerimento para a audiência, iniciou o debate destacando importância de trazer esse tópico para a Casa Legislativa, em resposta às solicitações de associações de mães que já vivenciaram essa experiência e enfrentaram desafios, além das demandas apresentadas por profissionais de saúde.

“Quero agradecer a presença de todos aqui, pois cada um tem uma história. Temos muito o que aprender, mas sobretudo ver como esse trabalho tão lindo feito por essas profissionais ganhe as condições necessárias. A prematuridade é um assunto que tem um impacto social e emocional na família, na questão econômica, na saúde, mas também na saúde da criança, porque se tiver o atendimento necessário”, destacou Portella.

Em seguida, a representante do Grupo de Mães Pedras Preciosas e da Associação Brasileira de Pais, Familiares, Amigos e Cuidadores de Bebês Prematuros em Roraima, Janynnie Matos, contou sua experiência com a prematuridade. Sua filha nasceu com 36 semanas de gestação e com cardiopatia congênita. A bebê faleceu aos 26 dias de vida.

Ela também pediu a implantação de uma política pública estadual voltada para faixa de etária de 0 a 12 anos. “Quem cuida do bebê de risco? O estado ou o município? Diante de tudo que eu li, acredito que possamos fazer uma indicação para que o estado tenha um lugar diferenciado, garantido por uma lei e decreto, pois o estado não tem obrigação de atender a criança antes dos 13 anos, apenas o município. Então, precisamos de algo legal que garanta esse atendimento estadual”, reivindicou.

Desafios e soluções

O primeiro painel da audiência contou com as falas de especialistas em saúde pública, como a neurologista pediatra Charlote Buffi Briglia e a médica neonatologista Celeste Maria Wanderley, que abordaram os fatores de risco para o parto prematuro, como infecções, doenças crônicas da mãe, complicações na gravidez e condições socioeconômicas adversas.

“As causas da prematuridade são diversas, como infecção urinária, hipertensão não controlada, diabetes gestacional, infecções sexualmente transmissíveis, entre outras. No entanto, tudo isso pode ser prevenido”, ponderou Wanderley.

Segundo a médica, a melhor forma de prevenção é a realização do pré-natal adequado. “O Brasil tem 12% partos prematuros, então são 1000 bebês prematuros por dia. Quero dizer que precisamos trabalhar muito no pré-natal bem feito. Cada bebê é um ser único. E o prematuro ainda é mais único. Vem com nuances. Por isso, é preciso de políticas públicas, já que é a primeira causa de morte até cinco anos de idade. E por onde se começa? A principal coisa é um pré-natal e o planejamento familiar”, complementou.

Por sua vez, Buffi Briglia, professora do departamento de Medicina da Universidade Federal de Roraima (UFRR) e médica do Centro de Referência da Mulher, elencou as principais intercorrências dos bebês prematuros, como doenças cardiovasculares, síndrome metabólica, neurológicas e psiquiátricas, e o maior risco de óbitos quando jovens adultos.

A médica evidenciou o recorte de classe de quem nasce prematuro no país, sendo que, em geral, são crianças pobres, negras, adolescentes, migrantes e que vivem em condições de saúde precárias. Além disso, cobrou a ampliação do acompanhamento multiprofissional e a descentralização dos atendimentos de saúde, para que as crianças tenham acesso aos serviços, independentemente de sua condição social ou de onde moram.

“Então, a primeira coisa que precisamos cobrar é que essa equipe seja disseminada e não fique apenas em um centro. Porque precisamos considerar as causas, já que nossa equipe é insuficiente para o número de crianças em nosso estado. Por exemplo, ele vai morrer em casa depois de meses na UTI [Unidade de Tratamento Intensivo] porque não teve acompanhamento adequado?”, apontou a professora.

A médica Patrícia Cavalcante, responsável pela UTI Neonatal do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth, também alertou para a escassez de profissionais de saúde qualificados em Roraima.

“Nossa localização geográfica dificulta a atração de profissionais para a região. Por isso, precisamos de políticas voltadas para eles, como capacitação e gratificações. Temos poucos profissionais na área e, se houvesse alguma política para melhorar esse ambiente, seria de grande importância, pois o futuro de um estado e de um país depende das crianças”, sugeriu Cavalcante.

Já fisioterapeuta Márcia Helena Tiecker Sartor falou sobre os avanços da área no tratamento de recém-nascidos, como uso de técnicas como a EPAP (Expiração com pressão positiva nas vias aéreas), e a coordenadora do Banco de Leite Humano da Maternidade, fonoaudióloga Silvia Furlin, relacionou a importância do pré-natal adequado para a doação de leite materno.

“Temos um número de 161 doadoras, que são mães altruístas. O leite humano não é apenas um alimento para nutrir; ele é proteção. O pré-natal é muito importante. Por exemplo, uma mulher diagnosticada com sífilis, e temos tido um número alto no estado, não pode doar. Porque selecionar o bebê de acordo com a gravidade mexe muito com a gente. Não adianta todo dia receber cadastros e eles serem reprovados por causa da sífilis”, disse Furlin.

A diretora do Centro de Referência da Mulher, Marília Pinto, apresentou a evolução do órgão, de 2009 a 2023, e um balanço dos serviços de saúde da unidade de saúde com as mães e bebês prematuros (pediatria, neoropediatria, serviço social, fisioterapia, oftalmologia, medicina fetal, entre outros) do laboratório Follow-Up. Ela ressaltou que é preciso sensibilizar a sociedade sobre as necessidades e direitos dos bebês prematuros e das suas famílias.

“É clichê, mas é verdade: investir na criança é investir no futuro da sociedade. Por isso, precisamos envolver todos no ‘Novembro Roxo’, para que todos possam entender sobre prematuridade. No Brasil, nascem 340 mil prematuros, extrema ou tardia, por ano. E no Centro de Referência só esse ano abrimos mais de 300 prontuários de bebês. Eles representam o futuro”, disse a diretora.

Outro ponto discutido foi a necessidade de oferecer apoio psicológico e social às mulheres que passam pela experiência da maternidade.

“Precisamos criar crianças saudáveis e famílias saudáveis para caminhar com essas crianças. Para isso, precisamos cuidar para que essas mães não cheguem tão fragilizadas. É aí que entra o planejamento familiar, que passa para ela os conhecimentos do que é o seu corpo e como funciona a reprodução. Se sabemos o que vai vir, nosso psicológico fica melhor. Por isso, eu sugiro um planejamento familiar. É um investimento em nós mesmas”, sugeriu a diretora-geral do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth, Laís Branco.

Após o debate, a palavra foi aberta à plateia, que demonstrou preocupação com o impacto da migração venezuelana na saúde pública local, e as especificidades da saúde indígena, entre outros assuntos correlatos.

Recomendações

Em resumo, a audiência pública discutiu uma série de recomendações para a prevenção da prematuridade e o apoio às famílias. Entre elas, estão:

  • Descentralização dos serviços de saúde;
  • Fortalecer a educação em saúde para conscientizar a população sobre os fatores de risco para o parto prematuro;
  • Garantir o acesso ao pré-natal de qualidade, com atenção especial às gestantes de risco;
  • Investir na qualificação dos profissionais de saúde que atuam na atenção à saúde materno-infantil;
  • Ampliar a oferta de serviços de saúde especializados e da equipe multidisciplinar;
  • Oferecer apoio psicológico e social às mulheres que passam por essa experiência.

A deputada Angela Águida Portella afirmou que vai acompanhar a implementação das recomendações e fazer uma reunião conjunta com as Comissões de Orçamento, de Saúde e da Criança e Adolescente da Casa Legislativa para discutir as sugestões dos especialistas e traçar um plano de ação.

“Para que possamos elaborar um plano e, dentro deste plano, constar um orçamento para o próximo ano, algumas ações. Apesar de que algumas ações não passam só por questões financeiras, já que é necessário fazer um plano de trabalho integrado com todos os municípios, com o compartilhamento de responsabilidade, em que o estado é apenas mais um ente, para que cada um possa fazer a sua parte”, concluiu a parlamentar.

O evento foi transmitido ao vivo pela TV Assembleia, no canal 57.3, pela Rádio Assembleia, na frequência 98.3 FM, e pelas redes sociais do Legislativo estadual (@assembleiarr).

Texto: Suellen Gurgel
Fotos: Eduardo Andrade/ Marley Lima/ Nonato Sousa

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