Imagine estar em um local onde você, mulher, vítima de violência doméstica e familiar, pode compartilhar suas vivências, trocar experiências e falar sobre traumas sem sofrer nenhum tipo de julgamento? É isso o que proporcionam os encontros do Grupo Terapêutico ‘Flor de Lótus’ da Secretaria Especial da Mulher (SEM) da Assembleia Legislativa (ALE-RR).
O projeto está em sua segunda turma, que se iniciou no último dia 28 de agosto. Cada uma terá um total de 21 encontros, que ocorrem todas às quartas-feiras, a partir das 9h, no auditório da SEM. Neles, as participantes aprendem diversos conceitos sobre a busca pela individuação, autoconhecimento, autoestima, amor-próprio e empreendedorismo. As participantes também terão aulas de autodefesa.
A psicanalista do Chame, Janaína Nunes, é a palestrante responsável por abordar os conteúdos que auxiliam na renovação da mente. Ela reforça que é importante a presença constante delas para que, a cada passo, possam se identificar umas com as outras e, nesse processo, surjam novas perspectivas e visão de luz no fim do túnel.
“E, ainda, para que essa personalidade que foi fragmentada possa ser realocada, e que elas enxerguem que ainda existe, sim, a individuação que elas perderam, além do amor-próprio e da autoestima. Tudo isso fará com que elas se fortaleçam, pois elas chegam com o emocional bastante fragilizado. Nós fazemos, apenas, uma condução, mas elas são as responsáveis por essa transformação e nós ajudamos nesse processo”, frisou.
A aposentada Maria (nome fictício) veio buscar ajuda para curar uma dependência emocional que se viu diante, após o casamento de mais de 30 anos chegar ao fim. “Estou me tratando, mesmo a pessoa nunca tendo me oferecido nenhum amparo em relação a nada. Nisso, eu não conseguia perceber que eu tinha capacidade de viver sem ele, pois sou independente financeiramente”, detalha.
Durante a relação, Maria sofreu abusos psicológicos, que tiveram início há mais de 28 anos, com o nascimento da primeira filha. “Começou uma competição pelo meu amor: ‘você dá mais atenção a ela do que a mim’, ele dizia. Daí, só foi agravando”, relembra. Mesmo não percebendo que estava em um relacionamento abusivo, e diante dos conflitos, ela seguiu tentando segurar a união. “Ele era meu tudo”, conta.
No entanto, o ápice das agressões foi quando o ex-marido ameaçou matá-la e, também, às três filhas em 2015. “A gente conseguiu fugir, acionamos a polícia e ele foi preso. Todas elas sofrem de depressão, de [síndrome de] borderline e uma séria de outras coisas por conta do pai”, relembrou, destacando que o agressor também necessita de ajuda. “Mas, ele tem de querer, porque eu quis e estou aqui me tratando”, assegurou.
Foi o ex-marido quem pediu o divórcio. Para ela, foi um baque, “eu fiquei sem chão”. Ela conta que chegou a pedir a ele que reconsiderasse o pedido, e que iria melhorar como pessoa, “eu achava que tudo era culpa minha”, contou.
Depois de muito sofrimento, a aposentada decidiu que deveria procurar ajuda em algum lugar. A princípio, ela tentou buscar apoio na Delegacia da Mulher, até que a sobrinha lhe informou sobre o Chame, o Centro Humanitário de Apoio à Mulher, que oferece de forma acolhedora, assistência psicológica e jurídica.
“Aqui, eu tirei dúvidas com relação ao divórcio, bens e também tive orientações. Eu digo que, você, que vive em um relacionamento abusivo como eu vivi, só vai conseguir sair se buscar ajuda. Saiam por detrás do muro, não liguem para o que as pessoas vão pensar. A minha dependência era tão grande, que eu não vivia para mim, só para ele. Então, quantas de vocês não estão nessa situação, também? A vítima sempre acha que é culpada, atribui para si responsabilidades que não são suas. Venham para entenderem e tirarem essa culpa que vocês não têm e que só vão entender se procurarem ajuda. Quebrem a vergonha e o medo”, aconselhou Maria.
Bastante emocionada, a aposentada espera o momento de aprender a fazer algo novo, por meio do incentivo ao empreendedorismo. “Todos os diplomas que eu tive, se apagaram diante do que eu sofri. Eu estou me tratando, pois eu me sentia inútil, que não sabia fazer nada. Eu sei que vou conseguir. Sei que tem muitas pessoas que vão me ouvir, que estão se sentindo assim e, no final, quero contar que todas as expectativas foram supridas”, concluiu.
Como participar
Conforme a diretora da SEM, Glauci Gembro, o órgão percebeu que os encontros propiciam uma conexão entre elas, a cada nova história compartilhada. “Isso as fortalece muito. Então, hoje, o que nós percebemos é que nos grupos terapêuticos vemos mais resultados para elas do que quando eram atendidas individualmente. Aqui, elas conseguem partilhar as suas superações, vão se descobrindo e se ajudando”, salientou.
Interessados em fazer parte do grupo, podem enviar uma mensagem para a ferramenta ZapChame no (95) 98402-0502, que serão inseridos na atual turma ou, se preferirem, nas próximas.
O órgão funciona na sede da SEM, na Avenida Santos Dumont, 1470, bairro Aparecida, e em Rorainópolis na Avenida Dra Yandara, nº 3.058, Centro. Os atendimentos presenciais são de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h. O programa também atende on-line, pela ferramenta ZapChame.
Texto: Suzanne Oliveira
Fotos: Alfredo Maia